Imagine o seguinte cenário: você dedica todos os seus esforços a um projeto de Ciência de Dados, manipulando dados reais complexos e codificando algoritmos inteligentes; porém, ao final do projeto, o modelo não consegue traduzir as informações em impacto no mundo real. Além disso, resulta em prazos não cumpridos, stakeholders confusos e insatisfeitos, e, às vezes, até mesmo sua carreira sendo posta em risco.
Isso é mais comum do que pensamos e, geralmente, pode estar relacionado à falta de princípios de outra área que é tão importante quanto o conhecimento técnico e estatístico para a ciência de dados. Essa área de conhecimento, habilidades e princípios é o Gerenciamento de Projetos — e, aqui, não entraremos nos pormenores se trata-se do modo tradicional ou do ágil.
Ao considerar artigo de Douglas A. Gray sobre expectativas irrealistas e sua relação com fracasso de projetos de Ciência de Dados, nota-se que expectativas irreais são realmente importantes para guiar o projeto por caminhos tortuosos, mas quando as analisamos numa visão macro, as expectativas do projeto, ou seja, os objetivos do projeto, estão claramente dentro do contexto do Gerenciamento de Projetos.
Em certo ponto, a magia técnica da ciência de dados que negligencia as ferramentas e princípios de gerenciamento de projetos é equiparável à tentativa de corrigir ou guiar um carro sem volante. Mesmo que uma discussão como essa seja importante para profissionais ou acadêmicos, ela deve se basear em evidências científicas em primeiro lugar. Por meio do aporte crítico e teórico disponível é possível a criação de discussões acerca da temática.
Leia mais: Carreira em Gestão de Projetos: conselhos de um aluno POLI USP PRO
Discussões sobre projetos de ciência de dados e gerenciamento de projetos
Ao pesquisar evidências científicas sobre projetos de ciência de dados e gerenciamento de projetos, poucas referências foram encontradas. Note que o “e” é uma conjunção de adição, sendo assim, a pesquisa se interessa em encontrar evidências que falam de ambos os construtos ao mesmo tempo. Dessa forma, esse baixo retorno de publicações nos direciona a duas possíveis afirmações diferentes:
- O uso de gerenciamento de projetos durante projetos de ciência de dados é tão amplamente utilizado que não são necessárias muitas pesquisas sobre a questão.
- A falta de princípios de gerenciamento de projetos é tão evidente em projetos de ciência de dados que existe uma lacuna considerável na literatura e na pesquisa científica neste campo.
É de se esperar que a primeira afirmação esteja equivocada porque, basicamente, a pesquisa científica quase sempre precede as aplicações práticas.
A falta de princípios de gerenciamento de projetos no campo da ciência de dados estará presente na lista de causas de falhas de projetos — este é o cenário mais provável e aqui explorado. Investigar alguns dos princípios de gerenciamento de projetos e como isso se relaciona com projetos de ciência de dados é uma maneira de corroborar as afirmações feitas por Douglas A. Gray em seu artigo e ir além, desafiando a pesquisa científica a analisar formas de como melhorar a interação destas duas áreas.
Leia mais: Big Data e Engenharia: é possível essa conexão?
Projetos de DSA e gestão de projetos: pontos em comum
- Escopo do projeto, definição de metas, alinhamento com objetivos da empresa, gestão de equipe (termo de abertura do projeto);
- Gestão de stakeholders;
- Plano de comunicação (cronograma, planejamento, monitoramento de progresso);
Exploraremos esses tópicos sem relacioná-los exclusivamente à abordagem de gerenciamento de projetos ágil ou à tradicional, mas a ambas. A última revisão do PMBoK reuniu muitas técnicas e princípios ágeis com a abordagem tradicional, criando uma visão de gerenciamento de projetos híbrido (tradicional e ágil) com a qual muitos pesquisadores concordam.
Leia mais: Conheça a Especialização em Gestão de Projetos da POLI USP PRO!
Escopo do Projeto
Nesse ponto existem diversas características a serem consideradas — como objetivos, escopo, metas, recursos e outros. No artigo de Douglas A. Gray a visão de metas irrealistas e o impacto delas nos projetos já é bem explorado. Aqui buscamos ir além no fato de que, por mais que as metas sejam bem definidas, não entender perfeitamente o escopo do projeto também pode desencadear situações durante o trabalho do cientista de dados que culminarão no fracasso do projeto.
A definição de escopo, muitas vezes, é entender e, pelo menos, pré-visualizar o projeto macro, desde o seu início até sua conclusão, observando quais etapas, conhecimentos e habilidades seriam necessários, e, também, o que há disponível e o que precisará ser adquirido. Charles Duhigg, escritor, e autor do famoso livro O poder do hábito (2012), também escreveu Mais rápido e melhor (2016), obra em que explora bem a importância e o impacto desta visualização macro das atividades no sucesso de um projeto ou de uma tarefa mais ampla a ser executada.
Outro ponto crucial que, sim, pode ser tomado como base de outros cenários já estudados — como o Gerenciamento de Projetos na metodologia Lean Six Sigma — é o alinhamento do projeto e das metas deste projeto com a estratégia da companhia.
Claramente o desalinhamento do projeto com os objetivos estratégicos da empresa podem culminar na não priorização das atividades e até mesmo no desinteresse pelo projeto, simples e diretamente por ele não fazer diferença alguma no resultado da companhia. Este fator é muito importante de ser observado, ainda que não isolado, uma vez que todos os princípios de gerenciamento de projetos interagem entre si de alguma forma. Isso ficará mais claro no ponto a seguir.
Leia mais: 3 habilidades comportamentais que você precisa conhecer
Gestão de Stakeholders
A gestão de stakeholders, ou dos patrocinadores do projeto, está diretamente ligada ao alinhamento do projeto com os objetivos da companhia. No entanto este alinhamento, entre projeto e objetos da companhia, não é suficiente, sendo também necessário que os principais patrocinadores desta proposta estejam engajados e comprometidos com as decisões e com o andamento das atividades.
Tudo isso só é possível se um bom delineamento e estruturação dos stakeholders forem realizados no planejamento do projeto. As partes interessadas — como é traduzido o termo stakeholders — precisam estar de acordo com as movimentações do projeto, e precisam, muitas vezes, decidir entre duas ou três opções de estratégia, além de terem de assumir riscos e patrocinar estratégias para mitigação de riscos, ou seja, possuem papel fundamental no ciclo de vida do projeto.
Se o papel das partes interessadas é tão fundamental para o projeto, por que não nos preocupamos com elas desde o início do planejamento das atividades?
Plano de Comunicação e Monitoramento de Progresso
Em linha do que foi mencionado nos pontos anteriores, o plano de comunicação e o monitoramento do progresso do projeto estão diretamente correlacionados com o planejamento de escopo e stakeholders. A comunicação eficaz de um projeto está baseada na ideia de alinhar expectativas entre as partes interessadas e o time de projeto.
Como parte interessada de um projeto, a comunicação deve ser suficiente para que se tenha conhecimento sobre o avanço deste projeto, os riscos envolvidos em cada etapa, as dificuldades que precisam ser coordenadas e os demais pontos que claramente são incertos em qualquer cenário, inclusive em projetos de Ciência de Dados.
Também estão entre as responsabilidades da parte interessada a comunicação sobre mudanças nos objetivos, os ajustes orçamentários e de recursos, entre outras condições de contorno que precisam chegar até o time de projeto para que este saiba como lidar com os recursos e métodos disponíveis.
Novamente o entendimento é similar, de nada serve um bom escopo de projeto, com stakaholders definidos, sem que um plano de comunicação esteja estabelecido para que a informação trafegue entre as partes.
Um bom plano de comunicação e acompanhamento possui periodicidade de reuniões, definição de quem será o responsável em relatar o avanço do projeto e para quem, entendimento sobre como é feita a gestão de risco do projeto e assim por diante.
Leia mais: Entenda como se tornar um líder coach na sua equipe
A importância da definição de metas no projeto de Ciência de Dados
Deste modo, diretamente alinhado ao que Douglas A. Gray escreveu em seu artigo, de fato a definição de metas é importante para o direcionamento de um projeto de Data Science, para o seu sucesso ou o seu fracasso.
Ainda nessa mesma linha de raciocínio, porém de modo mais abrangente, práticas de gestão de projetos, sejam elas baseadas em metodologias ágeis ou tradicionais, possuem influência significativa para o direcionamento e o encerramento dos projetos alinhados aos objetivos traçados.
Ao contrário de outras áreas de pesquisa, ainda existem poucos estudos e pesquisas aplicadas aos benefícios e efeitos da condução de projetos de Data Science com princípios e técnicas de gestão de projetos. O desenvolvimento de estudos que visem preencher esta lacuna, faz com que esta combinação de áreas se torne cada vez mais otimizada e voltada às melhorias que são possíveis de serem implantadas aos projetos de Data Science.
Para os especialistas em Data Science, a mensagem final é de que desenvolver habilidades voltadas para o gerenciamento de projetos pode de fato auxiliar na melhor condução dos seus projetos.
As dificuldades e percalços encontrados, que muitas vezes impossibilitam um bom modelo de transformar informação em resultado prático, podem estar relacionados à falta de um bom escopo de projeto, um stakeholder que não está comprometido ou envolvido nas decisões chave do projeto, uma meta ou objetivo que não está alinhada com o foco principal da empresa, um risco que está sendo negligenciado, entre outras diversas causas que afetam o sucesso de projetos.
Texto escrito por: André C. Zanezi, mestrando em Engenharia de Produção
Quer saber mais sobre o tema? Conheça os MBAs da POLI USP PRO!
Você também pode gostar desses conteúdos:
O que é gestão de projetos e qual sua importância para empresas
Como o Big Data está presente no mercado?
Conheça a importância da pós-graduação no mercado de trabalho